terça-feira, 18 de setembro de 2012

Desistir é Viver Morto

Acordou seco de vida...
Acordou seco para a vida...
Mas vestiu o corpo que não sentia

A historia já não se lia mais nas páginas
Ele, seguia as ruas
E virava nas curvas
Sombra do pó dos ossos velhos
O pó intoxicante da miséria
O pó que queima sem nunca cessar

Estava sozinho no beco, no mundo
Onde só o seu respirar profundo, se ouvia
Preso às quatro paredes de uma cria
Abandonada pela sua mãe esguia:
-A determinação de ser alguém

E foi assim que se olhou ao longe, no rio
Debaixo de si, debaixo de uma figura de nada
Um fantasma de sóbria dor
A ponte tremendo, e os seus pés firmes

Foi assim, até nada mais ser
A história já não se lia mais nas páginas
Acabada pelo desistir de um fogo
Mísero, velho, esquartejado


Ser; Eu

Não esqueças que és uma luz
Num mundo de segredos escondidos
Por corações encriptados na noção frágil
Do que é realmente a sua vontade

Sabes que és forte e que consegues
Que as tuas pernas acreditam em ti
Que o teu cerne é a tua estátua
E sabes que as palavras são cruas
Na boca de quem esquece o que é ferir

Os dias são ciclos de melhores ou piores rotinas
Talvez até já tenhas notado nas direcções do vento
Inconstante na sua inconsistência de nos empurrar
Por vezes até nos querendo derrubar, como figuras fracas
Soturnos como janelas baças

Serás sempre assim
Imortal em ti mesmo, invencível
O peso de ouro no coração
Firme, incorruptível





sábado, 15 de setembro de 2012

Persona

Qual vida é vida sem influência
Sem a aprendizagem crua dos sentimentos
Presa na pele como rebentos 
Do que nós somos

Na inútil vida, dádiva curta
Esculpimos em terra a nossa estátua
A persona que nos mascara consistentemente
'Somos o que queremos'

Nada somos sem sermos tudo
E nada ficamos a ser
Por tudo ser inalcansável 
Por tudo o que somos
Não ser tudo, mas sim pouco
Vago, insípido...

Teu Olhar

O teu mundo é um frasco
Fechado por cem tampas 
De mármore negro 

O teu mundo é um frasco 
O vácuo sem nome 
Plastificado na tua pele 

O teu mundo é um frasco 
Um casúlo severo 
Sem vontade de eclodir 

O teu mundo é um frasco 
De vidro baço 
Onde vês os outros mundos 
Sem compreender e sem amar 
Retrato falhado 
Distorcido pelo teu olhar

segunda-feira, 9 de abril de 2012

A Calçada

Pedras da calçada onde nos vemos
Pisando-as todos os dias
Crendo-as inquebráveis
Elas não são mais do que uma simples ilusão,
Uma demonstração do que somos

A estrada não segue sempre em frente
Por mais que queiramos, enquanto em sinuosas curvas,
Sentimos a vertigem do medo
Perdurando entre as paredes do coração
E talvez aí, numa reflexão
Interiorizando a nossa má sorte ali tão perto
Acreditamos que as pedras da calçada
Se estilhaçam no tempo

Verdade pura e sincera
O que acreditamos é diminuto
Mentindo-nos a cada minuto
A cada segundo que se passa entre dedos
Como nos passamos sobre aquele passeio
Onde nunca soubemos o que era a queda

Tudo se quebra, tudo se desfaz
Até os alicerces do mar
Até a nossa vontade impulsiva, impensada
Nunca nos deixando alimentar da ganância
Sem que ela nos devore para sermos nada...

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Às Portas do Paraíso

Seguindo os fios do céu
Marcando passo sobre o estrelado céu fluente
Montanhas pintadas de leve branco
Algumas sorrindo ao sol poente

São poucas as luzes que vêem os homens das alturas
Constelações encadeadas pelos rios de luz,
Desvanecendo,
Homens, que em filas nuas percorrem a frescura
Da terra, eterna como o tempo

São mil, os milhões que aqui se perdem
Desconhecendo, mas sabendo o sabor de sonhar
Olham os fundos amargos escuros
Negros, que lhes chamam o olhar,
O nome com voz leve, imensa

Condenados da sua escolha
Esquecem do medo o intelecto
E andam para um trilho sem tecto
De onde nunca poderão voltar

Os restantes, os sóbrios de não pensar
Seguindo o suave sentido da melodia
Que roda no coração e toca em toda a plenitude
Já nem da sensação de altitude
Percebem que não são mais do que velhas almas
Cansadas da vida lúcida e carnal
Onde dos séculos, cada um se tornou imaterial

O passado deixa de existir
Os portões abrem-se num eclodir luminoso
São magros os compassos e contratempos
Absorvidas as almas e sugados os momentos
Fatal sonho de morrer
Sobre o paraíso, dormem na nobreza de nascer
Para sempre...

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Justiça: Reflexão

Acredito que talvez a justiça seja prática
Esboçada no esforço sistemático de cada um
Resultando apenas para os que vivem no padrão

Mas qual é o termo certo para esta justiça
Aquela que fecha os olhos à diversidade
Que regue a sua missa, a sua honestidade
Sobrepondo as suas ideias em contradição

De facto, à medida que vivemos, progredindo
Reparamos nos seus pequenos defeitos que nos afectam
Evoluindo, sempre à espreita do erro que justifique
A injustiça, não a justiça, para os que pecam

Mas o que torna eticamente errado o acto
O que prova uma conclusão, um desfecho negativo
Senão a linguagem humana, adaptada
Recriada aquando do momento decisivo

Por vezes sentimos um cru desespero
Caindo na busca perdida pelo chão
Acreditando na perseverança e não no medo
E na luta, que será da queda o nosso colchão

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

O Último Som do Rio

Ele sente o afluente frio
Do rio que lhe corre aos pés
Movendo-se sistematicamente, em marés

Nasceu aqui e nada mais conhece
Se não o movimento padrão do milho ao vento
O eco celeste da voz no prado
Que se propaga ondulante no momento
Da mais comum despedida

Procura nas árvores o sentimento
O medo de perder os ramos da sua criança
Sobre tantos deles se perdeu do tempo
E agora, sobre eles, perde a esperança
De os rever mais uma vez

Talvez dos olhos lhe fuja a mágoa
A melancolia crua ao ver o céu
Chamando as núvens uma a uma
Para que delas leve uma recordação
Um magro pedaço de anjo, no coração

As mãos percorrem os muros
Conhecem-nos desde muito novas
Até os mais pequenos relevos sujos
Sobreviventes à erosão

No fim do seu trilho, inerte
Quebrado pelos vasto adeus
Tocam-se os olhos, em vão
E chama um nome tremendo
O nome do velho cão

Fechou o portão atrás de si
Um dia talvez volte repleto de coragem
Mas sabendo que as memórias se perderam
Que naquele rio, na margem
Jaz esquecida a sua infância